12 de ago. de 2007

Uma tese, acreditem, é apenas uma tese

Quem me passou este texto foi a Fabi, namor, por meio de e-mail, que por sua vez deve ter lhe chegado por e-mail também e por aí vai. Tentei pesquisar (estou meio sem paciência hoje, entenda...) e o mais perto que cheguei foi que se trata de um texto de 1998, do Caderno 2, Estado de São Paulo, de autoria do Mário Prata. Por bom, resolvi postar igual. Digamos que tem a ver com o atual momento evolutivo deste que vos escreve e de tantos outros mais. Vê aí:

"Uma tese é uma tese

Sabe tese, de faculdade? Aquela que defendem? Com unhas e dentes? É dessatese que eu estou falando. Você deve conhecer pelo menos uma pessoa que jádefendeu uma tese. Ou esteja defendendo. Sim, uma tese é defendida. Ela éfeita para ser atacada pela banca, que são aquelas pessoas que gostam debotar banca.
As teses são todas maravilhosas. Em tese. Você acompanha uma pessoa meses,anos, séculos, defendendo uma tese. Palpitantes assuntos. Tem tese que nãoacaba nunca, que acompanha o elemento para a velhice. Tem até tesespós-morte.
O mais interessante na tese é que, quando nos contam, são maravilhosas,intrigantes. A gente fica curiosa, acompanha o sofrimento do autor, anos afio. Aí ele publica, te dá uma cópia e é sempre - sempre - uma decepção. Emtese. Impossível ler uma tese de cabo a rabo.
São chatíssimas. É uma pena que as teses sejam escritas apenas para ojulgamento da banca circunspecta, sisuda e compenetrada em si mesma. E nós?
Sim, porque os assuntos, já disse, são maravilhosos, cativantes, as pessoassão inteligentíssimas. Temas do arco-da-velha. Mas toda tese fica no rodapéda história. Pra que tanto sic e tanto apud? Sic me lembra o Pasquim e apudnão parece candidato do PFL para vereador? Apud Neto.
Escrever uma tese é quase um voto de pobreza que a pessoa se autodecreta. Omundo pára, o dinheiro entra apertado, os filhos são abandonados, o maridoque se vire. Estou acabando a tese. Essa frase significa que a pessoa vaisair do mundo. Não por alguns dias, mas anos. Tem gente que nunca maisvolta.
E, depois de terminada a tese, tem a revisão da tese, depois tem a defesa datese. E, depois da defesa, tem a publicação. E, é claro, intelectual que sepreze, logo em seguida embarca noutra tese. São os profissionais, em tese. Opior é quando convidam a gente para assistir à defesa. Meu Deus, que sono.Não em tese, na prática mesmo.
Orientados e orientandos (que nomes atuais!) são unânimes em afirmar quetoda tese tem de ser - tem de ser! - daquele jeito. É pra não entender,mesmo. Tem de ser formatada assim. Que na Sorbonne é assim, que em Coimbratambém. Na Sorbonne, desde 1257. Em Coimbra, mais moderna, desde 1290.
Em tese (e na prática) são 700 anos de muita tese e pouca prática.
Acho que, nas teses, tinha de ter uma norma em que, além da tese, o elementoteria de fazer também uma tesão (tese grande). Ou seja, uma versão para nós,pobres teóricos ignorantes que não votamos no Apud Neto.
Ou seja, o elemento (ou a elementa) passa a vida a estudar um assunto quenos interessa e nada. Pra quê? Pra virar mestre, doutor? E daí? Se eleestudou tanto aquilo, acho impossível que ele não queira que a gente saiba aque conclusões chegou. Mas jamais saberemos onde fica o bicho da goiabaquando não é tempo de goiaba. No bolso do Apud Neto?
Tem gente que vai para os Estados Unidos, para a Europa, para terminar atese. Vão lá nas fontes. Descobrem maravilhas. E a gente não fica sabendo denada. Só aqueles sisudos da banca. E o cara dá logo um dez com louvor.Louvor para quem? Que exaltação, que encômio é isso?
E tem mais: as bolsas para os que defendem as teses são uma pobreza.
Tem viagens, compra de livros caros, horas na Internet da vida, separações,pensão para os filhos que a mulher levou embora. É, defender uma tese émesmo um voto de pobreza, já diria São Francisco de Assis. Em tese.
Tenho um casal de amigos que há uns dez anos prepara suas teses. Cada um,uma. Dia desses a filha, de 10 anos, no café da manhã, ameaçou:
- Não vou mais estudar! Não vou mais na escola.
Os dois pararam - momentaneamente - de pensar nas teses.
- O quê? Pirou?
- Quero estudar mais, não. Olha vocês dois. Não fazem mais nada na vida. Ésó a tese, a tese, a tese. Não pode comprar bicicleta por causa da tese. Agente não pode ir para a praia por causa da tese. Tudo é pra quando acabar atese. Até trocar o pano do sofá. Se eu estudar vou acabar numa tese. Queroestudar mais, não. Não me deixam nem mexer mais no computador. Vocês achammesmo que eu vou deletar a tese de vocês?
Pensando bem, até que não é uma má idéia!
Quando é que alguém vai ter a prática idéia de escrever uma tese sobre atese? Ou uma outra sobre a vida nos rodapés da história?
Acho que seria uma tesão."

3 comentários:

Rodrigo Nascimento disse...

... estou passando por um evento de natureza parecida... a mono...

abço

Anônimo disse...

Putz, mto realista este texto... hahaha! Como diz minha orientadora: durante a produção da dissertação ou tese, ficamos "monotemáticos" e tudo se dá em torno dessa produção. Eita coisinha q consome o autor!

Unknown disse...

vou para o rodapé da história......